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"Pequi or not Pequi?"

Minas Gerais, Goiás e Tocantins disputam 'Ouro do Cerrado'

Três projetos no Congresso Nacional requerem a paternidade do pequi, enquanto guia internacional aponta a iguaria como 2º pior prato do Brasil

26/11/2024 - 11:57 Por Wilson Lopes

O pequi tem a mesma representatividade para o Cerrado do que o açaí para a floresta amazônica. E, para o deleite dos goianos, a produção está em alta no Estado. Conforme revela a edição do boletim ‘Agro em Dados’, foram extraídas em Goiás 3,7 mil toneladas de pequi, em 2023. A produção supera em 21,8% a do ano anterior e representa um recorde na série histórica da extração do fruto em Goiás.

Segundo dados da pesquisa ‘Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura (Pevs) 2023’, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o fruto gerou R$ 5,65 milhões em valor de produção, número que corresponde a 37,1% do valor de produção total na extração vegetal em Goiás e 98,6% de todo o extrativismo realizado, consolidando o estado como o segundo maior produtor nacional, atrás de Minas Gerais (39,6 mil t). 

Os municípios goianos com a maior quantidade extraída de pequi no período de referência foram Sítio d’Abadia (989t), Damianópolis (599t) e Mambaí (385t), todos localizados no Nordeste goiano.

“A produção de pequi pode contribuir para o crescimento econômico de regiões com potencial produtivo ainda pouco explorado, gerando mais empregos e melhoria de renda para populações carentes”, explica o titular da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa-GO), Pedro Leonardo Rezende.

Culinária nativa

A Emater Goiás iniciou a doação da safra 2024 de pequi para o Banco de Alimentos da Organização das Voluntárias de Goiás (OVG). A iniciativa contribuirá com a alimentação de milhares de famílias goianas em situação de vulnerabilidade social atendidas pela instituição.

Este é o segundo ano da ação, que tem como objetivo apoiar a alimentação de milhares de pessoas em situação de vulnerabilidade social atendidas pela instituição.

O presidente da Emater Goiás, Rafael Gouveia, ressalta que os frutos que serão doados semanalmente, durante a safra, para o Banco de Alimentos são cultivados na Estação Experimental Nativas do Cerrado na sede da Emater, em Goiânia. No local, estão plantados em uma única área cerca de mil pés do fruto. 

O caroço do pequi é dotado de muitos espinhos, bem pequenos, e a variedade desenvolvida pela Emater/Embrapa, sem espinhos: sonho de consumo do mercado (Fotos Ênio Tavares e Alexandre Paes/OHoje)

Pequi sem espinhos

O pequi pode ser consumido cru ou cozido. Seu caroço é dotado de muitos espinhos, bem pequenos, e há necessidade de muito cuidado ao roer o fruto. 

Além de seu sabor marcante, é uma fonte rica de nutrientes, como carotenóides, vitamina A e antioxidantes, que promovem a saúde e ajudam na prevenção de doenças. O fruto também se destaca por sua versatilidade: pode ser usado na alimentação, na produção de óleos para cosméticos, biocombustíveis, e até no uso medicinal.

Em 2022, a Emater e a Embrapa Cerrados lançaram uma nova variedade, de pequi sem espinhos. O trabalho de pesquisa com pequi sem espinhos se iniciou há 25 anos a partir da demanda de produtores e da sociedade goiana por pequizeiros mais rentáveis e frutos saborosos. Assim, após encontrar a variedade na natureza, surgiram as pesquisas de clonagem, que se iniciaram com a propagação de mudas por sementes, estaquia e enxertia. 

Dr. Ailton Pereira, da Embrapa e Dra Elainy Botelho, da Emater, recebem uma premiação do presidente da Emater Goiás, Rafael Gouveia (Secom/GO)

Os trabalhos de pesquisa foram coordenados pela pesquisadora da Emater, Dra. Elainy Pereira, e pelo pesquisador Dr. Ailton Pereira, da Embrapa Cerrados, na Estação Experimental Nativas do Cerrado, em Goiânia, e na Estação Experimental de Anápolis.

Inicialmente, 20 mudas foram plantadas no banco de germoplasmas da Emater – que hoje possui mais de 1.600 pequizeiros – e as plantas foram avaliadas durante anos, tornando possível multiplicar os pés e apurar a qualidade do fruto.

Agora, as mudas de plantas que produzem pequis sem espinhos e também pequis com espinhos, mas de qualidade ímpar, são entregues à sociedade, com as devidas instruções e informações para o correto manejo do material. As seis cultivares de pequi que foram lançadas são registradas no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

A Emater criou um cadastro on-line em 2022 para comercializar mudas de pequi sem espinho por R$ 50. O cadastro foi suspenso em 2023 com 50 mil interessados na lista de espera. A capacidade de produção da instituição é de 5 mil a 10 mil mudas por ano. 

A safra 2024/2025, que começou recentemente, vai até março de 2025 (Empaer)

De setembro a março

Na Ceasa/GO, o pequi chega ao entreposto em caminhões vindos das zonas extratoras, a partir do mês de setembro. Dessa época até meados de outubro, as vendas são mantidas com o pequi goiano e tocantinense. Nesse período, dá entrada na companhia as cargas da produção goiana vindas do norte goiano, de cidades como Porangatu, Crixás e Santa Tereza.

Com menos expressividade, o pequi matogrossense pode ser encontrado no mercado em meados do mês de novembro. Já o fruto mineiro chega em maior volume e pode ser encontrado na Ceasa em dezembro e mantém a demanda até janeiro.

De acordo com levantamento da Divisão Técnica da Ceasa/GO, na safra 2022/2023, foram comercializadas na Ceasa/GO 6.414 toneladas de pequi, o que perfaz uma movimentação financeira na ordem de R$ 10,4 milhões.

Já na safra 2024/2025, que começou recentemente e vai até março de 2025, já entraram na empresa 1.174 toneladas, número considerado relevante, apesar da seca e das queimadas que afetaram o país – em especial o Cerrado – na estação seca.

Enquanto o teste de DNA não revela a paternidade do pequi no Congresso Nacional, em Goiás o fruto ganhou até um dia no calendário oficial do Estado (28/08) - (Empaer) 

“É pra acabar com o pequi do Goiás!”

A expressão “É pra acabar com o pequi do Goiás!” mostra a surpresa, a indignação e o susto dos goianos quando uma situação lhes parece espantosa. E foi justamente assim que regiram ao tomar conhecimento do Projeto de Lei 193 (04/02/2021), de autoria do Delegado Marcelo Freitas, conferindo ao município de Montes Claros, em Minas Gerais, o título de ‘Capital Nacional do Pequi’. 

Pronto! Estava deflagrada a ‘Revolta do Pequi!’ Goianos se sentiram traídos. Inconformado, o deputado José Nelto retrucou com o Projeto de Lei 351 (09/02/2021), tonando o ‘Pequi Goiano Patrimônio Cultural, Ambiental e Ecológico Nacional’. Atualmente os dois projetos encontram-se nas comissões de Cultura e Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados.

Invocando a consaguinidade entre Goiás e Tocantins, o Senador Eduardo Gomes resolveu enfiar a colher de pau na panela e subiu o tom da discussão, apesentando o Projeto de Lei 862 (12/03/2021) declarando o Pequi, Fruto do Pequizeiro, Típico da Cultura dos Estados de Goiás e Tocantins, Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. A matéria está na Comissão de Educação e Cultura, aguardando relatório do senador Wilder Morais.

Enquanto o teste de DNA não revela a paternidade do pequi no Congresso Nacional, em Goiás o fruto ganhou até um dia no calendário oficial do Estado (28/08), por meio da Lei nº 22.229, sancionada pelo governador Ronaldo Caiado. A lei tem o objetivo de promover a conscientização sobre a importância do pequi e reconhecer sua influência na identidade de Goiás.

O deputado estadual Coronel Adailton também propôs reconhecer o ‘arroz com pequi’ como Patrimônio Cultural, Gastronômico e Imaterial goiano. Essa propositura está inserida no projeto 22899/24, em tramitação no Parlamento goiano. O projeto será analisado pela Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ) e, caso aprovado, seguirá para votação em duas fases no Plenário.

Arroz com pequi (Pixabay)

Por falar no ‘arroz com pequi’, o guia on-line ‘TasteAtlas’ manteve pelo segundo ano consecutivo o prato como a segunda pior comida do Brasil, atrás apenas do ‘cuscuz paulista’. Entre as 37 piores comidas selecionadas pelo guia estão pé-de-moleque (18º), salada de maionese (19º), pamonha (30º), X-tudo (31º) e galinhada (32º). Está bom para os goianos? O ranking TasteAtlas é baseado nas avaliações do público e atualizado semanalmente. 

O Projeto de Lei 1970 (02/04/2019) institui a ‘Política Nacional para o Manejo Sustentável, Plantio, Extração, Consumo, Comercialização e Transformação do Pequi (Caryocar brasiliense) e demais Frutos e Produtos Nativos do Cerrado’

Pequi no forno, servindo de lenha 

A Portaria 113 (29/12/1995) do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que disciplina a exploração das florestas primitivas nas regiões sul, sudeste, centro-oeste e nordeste, proibia, em seu Art. 16, o corte e a comercialização do pequizeiro ‘Caryocar spp’, bem como o desmatamento de áreas onde houver a ocorrência natural de maciços florestais da espécie. 

Por meio de um Projeto de Decreto Legislativo de Sustação de Atos Normativos do Poder Executivo (PDC 903/2018, de 21/03/2018), o deputado Professor Victório Galli (PSC-MT) tentou sensibilizar seus pares para sustar o trecho da Portaria 113/95 do Ibama que proibia a prática, alegando que das dez espécies do gênero quatro podem ser usadas para fins de exploração de manejo florestal. O texto até hoje está parado nas comissões de Meio Ambiente, Desenvolvimento Sustentável, Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados.

Enquanto o pequi cozinhava na Câmara, o ex-Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, aquele que viria a sugerir “passar uma boiada” em alusão a flexibilização da legislação ambiental, enquanto a atenção da mídia estava voltada para pandemia da Covid-19, publicou a Portaria 32 (23/01/2019), proibindo o corte de pequizeiro ‘Caryocar spp’ em áreas situadas “fora dos limites do bioma Amazônia”, exceto nos casos de exemplares plantados.

Dias após, o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, publicou a Portaria 229 (25/01/2019), revogado o artigo 16 da Portaria Ibama 113/1995. Na prática, estava feita a vontade do deputado Professor Victório Galli.

Uma nova chance ao pequi em pé pode vir com o Projeto de Lei 1970 (02/04/2019), apresentado pelo deputado mineiro Rogério Correia, instituindo a ‘Política Nacional para o Manejo Sustentável, Plantio, Extração, Consumo, Comercialização e Transformação do Pequi (Caryocar brasiliense) e demais Frutos e Produtos Nativos do Cerrado’.

O Art. 2º do projeto proíbe a derrubada e o uso predatório dos pequizeiros existentes no território nacional e prevê a criação de estímulos para a sua exploração econômica sustentável por comunidades tradicionais.

O texto foi aprovado pela Comissão de Meio Ambiente e segue agora para análise da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, com a senadora Soraya Thronicke. A conveniência do uso sustentável dos frutos do cerrado foi defendida pelo relator do projeto, Jorge Kajuru.

Com informações, Juliana Carnevalli, Kattia Barreto, Hosana Alves e Comunicação Setorial da Emater.

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Acesse o boletim ‘Agro em Dados’>>

Acesse o Projeto de Lei n° 193/2021 – Confere ao município de Montes Claros, em Minas Gerais, o título de ‘Capital Nacional do Pequi

Acesse o Projeto de Lei n° 351/2021 – Torna o ‘Pequi Goiano Patrimônio Cultural, Ambiental e Ecológico Nacional>>

Acesse o Projeto de Lei n° 862/2021 – Declara o Pequi, Fruto do Pequizeiro, Típico da Cultura dos Estados de Goiás e Tocantins, Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil>> 

Acesse Ranking ‘TasteAtlas’ - 37 Piores Comidas Brasileiras>>

 


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