O ‘Panorama Estatístico Brasileiro de Motocicletas, Motonetas e Ciclomotores’, publicado pela Secretaria Nacional de Trânsito, (Senatran), órgão responsável pelo controle e fiscalização da política de trânsito no País, revelou uma verdade inconveniente: mais da metade dos donos de motocicletas no Brasil não tem habilitação específica para a categoria, portanto, nem deveria tirar a ‘furiosa’ da garagem para dar uma volta no quarteirão.
Segundo o estudo, dos 32,5 milhões de proprietários de motos, motonetas e ciclomotores registrados no Brasil, 17,5 milhões, o que equivale a 53,8% do total, não têm Carteira Nacional de Habilitação (CNH) válida para conduzir esses veículos.
Esse dado, alerta o relatório, indica que os proprietários de motocicletas não pilotam seus veículos ou o fazem de forma irregular, por não possuírem permissão, e aponta para questões como o uso de veículos compartilhados, aluguel de motocicletas ou motonetas, ou até mesmo a preferência por utilizar veículos de familiares e amigos, o que pode indicar mudanças nas dinâmicas de condução desses veículos no Brasil.
O Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam) utiliza da classificação do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que distingue as motos em três categorias: motocicleta (80,9%), motoneta (17,6%) e ciclomotor (1,5%).
Para pilotar motocicleta e motoneta, é necessário ter a CNH na categoria A ou em uma das suas combinações: AB, AC, AD ou AE. Para dirigir ciclomotores, além das categorias mencionadas, é possível obter uma Autorização para Conduzir Ciclomotores (ACC).
Nos três casos, porém, o art. 54 do CTB, exige dos condutores de motocicletas, motonetas e capacete de segurança, com viseira ou óculos protetores. O art. 55 exige o mesmo dos passageiros transportados.
Já o art. 57 estabelece que os ciclomotores devem ser conduzidos pela direita da pista de rolamento, proibida a sua circulação nas vias de trânsito rápido e sobre as calçadas das vias urbanas.
Assim como os veículos automotores, as motocicletas, motonetas e ciclomotores estão sujeitos às infrações do Código de Trânsito Brasileiro, principalmente aquelas relacionadas à segurança dos condutores e passageiros.
Dentre elas, quatro específicas tratam do uso de capacete, que é considerado uma das medidas mais eficazes para reduzir a gravidade das lesões e fatalidades em sinistros com motocicletas. Segundo o relatório “Powered Two-and Three-Wheeler Safety: A Road Safety Manual for Decision-Makers and Practitioners” da Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso de capacete é fundamental para proteger os motociclistas e passageiros, podendo reduzir o risco de morte em 37% e de lesões graves na cabeça, acerca de 69%.
O relatório da Senatran descreve que a preferência por motocicletas em vez de automóveis pode ser atribuída a diversos fatores econômicos e práticos, como a acessibilidade e custo de manutenção, além da economia significativa de combustível, e de conseguir proporcionar maior agilidade e mobilidade no trânsito. Isso sem contar com a precariedade do transporte público.
Conforme dados do Renavam, foi na década de 1970, época em que a primeira fábrica de motocicletas foi inaugurada no país, que se iniciou a expansão do mercado no Brasil, alcançando 1.470.292 motocicletas fabricadas na virada para o século XXI.
Nos anos 2000, o número de motocicletas fabricadas continuou a crescer, com o desenvolvimento econômico do país, a expansão da classe média e a maior demanda por veículos de transporte econômico e eficiente.
Esse período tem seu auge em 2008, com 2,2 milhões de unidades. A partir de 2012, o número começa a declinar acentuadamente, atingindo um ponto baixo por volta de 2017, queda relacionada à crise econômica no Brasil, a redução do poder de compra da população e mudanças no mercado de transporte, como a popularização de aplicativos de transporte e novas formas de mobilidade urbana.
Após 2017, houve uma recuperação gradual no quantitativo dos registros, após à retomada do crescimento do mercado interno e à adaptação das indústrias a novas demandas e tecnologias.
Outro dado que desperta a atenção no Panorama da Senatran é que, no início dos anos 2000, a categoria das motocicletas representava 23,2% do total de veículos emplacados no Renavam, em relação à frota total. Em julho de 2024, esse percentual aumentou para 41,5%, superando o pico anterior de 40% observado em 2008, ano com maior número de novos emplacamentos para esses veículos.
O relatório estima que, mantendo a evolução média anual de 2,8 pontos percentuais dos últimos quatro anos, “em aproximadamente três anos, motocicletas, motonetas e ciclomotores poderão representar mais de 50% dos novos emplacamentos”.
Com relação à frota que já circula pelas ruas brasileiras, os veículos de passeio compõem a maior parte da frota, correspondendo a mais de 64,55%, enquanto as motocicletas, motonetas e ciclomotores representam cerca de 28,03% do total de veículos (julho/24).
Entre as unidades federativas, São Paulo lidera o ranking do total de motocicletas, motonetas e ciclomotores por estado, com 7 milhões; seguido por Minas Gerais com 3,5 milhões e Paraná com 1,4 milhão. Outros estados, como Rio Grande do Sul, Ceará, Goiás e Pernambuco, também apresentam números significativos, todos acima de 1 milhão.
Contudo, o percentual desses transportes em relação ao total de veículos por estado revela as particularidades do Brasil. Nesse caso, os estados com os maiores percentuais são: Maranhão (59,7%), Piauí (55,1%), Pará (54,5%), Acre (53,1%) e Rondônia (51,2%).
Esses estados apresentam uma alta proporção de motocicletas, motonetas e ciclomotores, indicando que são meios de transporte predominantes, possivelmente devido a fatores econômicos, geográficos e culturais.
A falta da CNH, e a consequente ausência dos condutores dos centros de formação, podem ter contribuído para o aumento no Registro Nacional de Infrações de Trânsito (Renainf) nos últimos anos.
Ao analisar a evolução das infrações, nota-se um aumento significativo a partir de 2017, primeiro ano após a resolução nº 607, que instituiu o Renaest. No entanto, em 2020, devido à pandemia de COVID-19 e às restrições impostas pelo confinamento, o número de multas caiu drasticamente para aproximadamente 150 mil.
Com o retorno gradual às atividades presenciais nos anos seguintes, tais como as atividades de entrega alimentícia, comumente realizada por motociclistas, o número de infrações voltou a aumentar, atingindo seu pico em 2023, com mais de 1,3 milhões de infrações registradas. Em 2024, até julho, já foram contabilizadas mais de 638 mil infrações relacionadas a motocicletas, motonetas e ciclomotores.
A multa por “Conduzir motocicleta sem usar capacete” é a mais comum entre os motociclistas, representando quase 43% dos registros.
Com relação à mortalidade no trânsito, o ‘Panorama Estatístico Brasileiro de Motocicletas, Motonetas e Ciclomotores’ usou três bases de dados que possuem características e métodos de coleta específicos.
O Registro Nacional de sinistros e Estatísticas de Trânsito (Renaest) foca em dados detalhados sobre sinistros de trânsito ocorridos em todas as vias brasileiras, e suas consequências.
A Polícia Rodoviária Federal (PRF) se concentra nos sinistros ocorridos em rodovias federais.
E o DATASUS, por sua vez, compila dados de mortalidade provenientes do sistema de saúde, incluindo informações de hospitais e outros estabelecimentos de saúde.
O relatório observa que a análise conjunta dessas bases de dados é essencial para entender melhor a dinâmica dos óbitos em sinistros de trânsito e, consequentemente, para a elaboração de políticas públicas mais eficazes e direcionadas à redução de óbitos no trânsito.
Com ou sem habilitação, respeitando ou não as leis de trânsito, as motocicletas já somam 34,2 milhões de veículos no sistema Renavam, o que representa uma massa considerável de 28% da frota de veículos nas ruas (em menos de sete anos serão 30%).
“Esses dados reforçam a necessidade de criação e do cumprimento de políticas públicas e estratégias de mobilidade adaptadas para abordar a segurança viária, promovendo um trânsito mais seguro para todos os condutores, especialmente os de motocicletas, motonetas e ciclomotores”, conclui o estudo.
Com informações, Luciano Nascimento, Agência Brasil.
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