Segundo turno define eleição em 15 capitais
Capitais da Região Norte têm desafios comuns a serem enfrentados e convivem com sérios problemas habitacionais e fundiários
26 OUT 2024 - 17H00 • Por Wilson LopesDas 26 capitais do país, 11 já decidiram a eleição municipal no primeiro turno: Boa Vista (RR), Florianópolis (SC), Macapá (AP), Maceió (AL), Recife (PE), Rio Branco (AC), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), São Luís (MA), Teresina (PI) e Vitória (ES).
No próximo domingo, 27/10, a disputa continua em segundo turno nas outras 15 capitais: Aracaju (SE), Belo Horizonte (MG), Belém (PA), Campo Grande (MS), Cuiabá (MT), Curitiba (PR), Fortaleza (CE), Goiânia (GO), João Pessoa (PB), Manaus (AM), Natal (RN), Palmas (TO), Porto Alegre (RS), Porto Velho (RO) e São Paulo (SP).
Além delas, outros 36 municípios, todos com mais de 200 mil eleitores, onde nenhum dos candidatos alcançou a maioria absoluta dos votos válidos no primeiro turno (ou seja, a metade, mais um), terão que voltar às urnas para escolher o próximo prefeito. Ao todo, são mais de 33 milhões de eleitores aptos a votar.
Capitais da Região Norte
Semelhanças geográficas e humanas da Região Norte tornam comuns alguns dos desafios a serem encarados pelos futuros prefeitos das quatro capitais que terão segundo turno nas eleições. Belém, Manaus, Porto Velho e Palmas vivem sérios problemas habitacionais e fundiários. Há também muito por fazer com relação aos índices de violência e a serviços públicos falhos, principalmente na área de saneamento, com impactos significativos na área de saúde.
Professor do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília (UnB), Fernando Luiz Araújo Sobrinho é autor de pesquisas sobre cidades da Amazônia. Ele desenvolveu diversos estudos relacionados a planejamento urbano e regional. Alguns deles, voltados a serviços e aspectos econômicos desta e de outras regiões.
Com relação às quatro capitais que elegerão seus prefeitos para os próximos quatro anos, ele elenca um conjunto de cinco problemas estruturais a serem enfrentados: a regularização fundiária, a promoção da habitação social, o saneamento básico, os serviços públicos e o combate à violência.
Políticas públicas, saneamento
O professor acrescenta que alguns destes problemas não são resolvidos em curto prazo, motivo pelo qual é fundamental que os políticos e gestores locais tenham consciência da importância de se dar continuidade às políticas públicas de bom resultado adotadas por seus antecessores, e que, depois, seja dada continuidade por seus sucessores.
Fernando Sobrinho explica que a questão do saneamento não está restrita a redes de água e esgotos, abrangendo também coleta do lixo e extinção das áreas de descarte chamadas lixões. “Se você tem uma cidade que 80% da área urbana não é servida de saneamento básico, nenhum prefeito, por mais que haja um cenário positivo, irá solucionar esse problema em um ou dois mandatos”.
Violência, regulação fundiária
A violência é também um sério problema a ser enfrentado. Com o agravante de a região fazer fronteira com países produtores de drogas, tornando-se rota para o tráfico de cocaína e, também, de armas. O cenário acaba facilitando o aliciamento de jovens dessas cidades para o crime.
Segundo o professor, uma das questões centrais que também afeta as cidades na Amazônia é a da regularização fundiária, algo que, até pelas características da região, tem relação com a questão habitacional, uma vez que é grande o número de pessoas que se deslocam para a localidade, na busca por uma vida melhor.
Mudanças climáticas
Uma outra questão a ser encarada, não apenas pelos prefeitos dessas cidades, mas de todos os municípios da Amazônia Legal, é a dos efeitos das mudanças climáticas na região.
A Amazônia tem passado por sucessivos anos de secas extremas. E seus rios têm papel fundamental para a conectividade e para a comunicação entre as populações da área rural; entre as cidades; e entre a região Amazônica e outras regiões do mundo.
“Isso, de certa forma, afeta a vida nesses municípios, tanto no sentido da conectividade como para a manutenção da vida, uma vez que a população ribeirinha e a população urbana dependem da água desses rios. A mudança nos padrões climáticos verificada nos últimos anos mostra que precisamos pensar em como essas cidades enfrentarão desafios globais como as mudanças climáticas em curso”, argumentou.
Belém
Fernando Sobrinho explica que, no caso específico de Belém – a maior metrópole da Amazônia brasileira, sede da COP-30 ano que vem – a cidade é agora um canteiro de obras, com várias intervenções no sistema viário, no saneamento básico, na mobilidade urbana e nas áreas degradadas dentro da cidade.
“Essas ações devem ter continuidade para além da COP-30, nos próximos anos. Não se pode pensar a cidade para um evento apenas. Belém tem de ser pensada para a vida dos seus moradores. Sua região metropolitana tem sido desprovida de políticas mais fortes e concisas. Há muitos aspectos a serem melhorados, em especial na área central da cidade, uma vez que Belém possui um patrimônio histórico extremamente importante”, explica o professor da UnB.
Os indicadores da capital paraense, segundo ele, são muito ruins em termos de habitação social, serviços públicos, saneamento, saúde pública e saneamento. “A mobilidade urbana também é um problema muito sentido na cidade. Projetos como o do BRT ainda não saíram efetivamente do papel. Com isso, continuam os problemas de trânsito, prejudicando o deslocamento da população na área urbana”, acrescentou.
Manaus
Apresentando um dos índices de crescimento urbano mais elevados do Brasil, devido à expansão das fronteiras agrícolas e oportunidades de emprego em sua zona franca, Manaus apresenta problemas muito sérios ligados a saneamento básico, a regularização fundiária e, principalmente, à questão das mudanças climáticas, segundo Fernando Sobrinho.
“Manaus segue uma tendência de concentração da população do estado. É uma cidade grande, com 2 milhões de habitantes. A segunda maior cidade do estado tem apenas 100 mil habitantes. Há, portanto, muitos desafios porque trata-se de uma cidade que ainda está crescendo, não tendo chegado a uma fase de estabilização do seu crescimento demográfico”, explicou o pesquisador da UnB.
Segundo ele, esse crescimento demográfico é reforçado por a capital amazonense receber também migrantes de outros países, principalmente fronteiriços, o que torna ainda mais necessário dotar a cidade de infraestrutura para esse crescimento urbano.
Aluno de mestrado da Universidade Federal do Oeste do Pará, João Neto Sousa Rodrigues desenvolve pesquisas sobre os processos de territorialização, voltados principalmente a terras quilombolas. Ele conhece bem três das quatro capitais em questão: Belém, Manaus e Porto Velho.
“No que se refere à política habitacional de Manaus, os problemas são cada vez maiores, com uma especulação imobiliária impulsionada pela verticalização, gerando o sufocamento de pessoas economicamente menos favorecidas nas periferias, gerando um crescimento desordenado, sem planejamento, tendo o estado um tempo muito lento de respostas aos problemas que decorrem desta situação”, disse ele à Agência Brasil.
Ele acrescenta que a saúde pública “continua a ser um tormento, sobretudo para a população pobre que depende deste serviço e tem que se desdobrar em longas filas de espera por atendimento especializado em hospitais lotados”.
Do ponto de vista dos efeitos das mudanças climáticas, Fernando Sobrinho reitera que “é grande a dependência que Manaus tem do transporte hidroviário”, e que, com essas secas cada vez mais presentes na Bacia do Rio Amazonas afetando a cidade, este é um problema muito grande para a sua população.
Porto Velho
Capital de Rondônia, Porto Velho integra redes na Amazônia tanto na questão da Bacia do Rio Madeira para a geração de energia, como também para transporte hidroviário. Sobrinho explica que a ligação entre Manaus e Porto Velho se transforma, hoje, em um porto estratégico para o agronegócio brasileiro – o que representa potencial logístico e oportunidades de emprego e renda.
Ele explica que há ali um dos portos da Amazônia brasileira que escoam a produção do Mato Grosso, além da produção agropecuária do próprio estado – o Porto Organizado de Porto Velho. “Nesse cenário de expansão do agronegócio e do comércio internacional do Brasil com o mundo, Porto Velho desempenha uma questão estratégica importante que pode melhorar as condições de vida na cidade”.
Por outro lado, por Rondônia estar próxima a fronteiras internacionais com Bolívia e Peru, acaba ficando vulnerável em termos de segurança, uma vez que há, na região, facções criminosas e milícias. “Isso precisará ser considerado pela futura gestão municipal”, diz o pesquisador.
Segundo José Neto, há na cidade sérios problemas decorrentes dos garimpos e da expansão do agronegócio, gerando muita poluição ambiental sobre a cidade e a região. Isso foi constatado também pelo levantamento do Instituto Cidades Sustentáveis. “Em relação a Porto Velho, chama atenção a questão das emissões de gases de efeito estufa (dióxido de carbono) per capita, que é elevadíssimo”, disse o coordenador Jorge Abrahão.
“Porto Velho é a cidade com maior emissão de gases de efeito estufa, com 62 toneladas emitidas por habitante a cada ano. É mais de 60 vezes o que é a meta para 2030. Temos aí um problema gravíssimo que está fortemente ligado à questão agropecuária. Uma ação intensa [dos futuros prefeitos] nesse ponto é fundamental”, acrescentou.
Palmas
Sendo a capital mais jovem do Brasil, Palmas tem a vantagem de ser uma cidade planejada. Sua área central tem uma excelente dotação de infraestrutura, pelo próprio planejamento original da cidade.
Na avaliação do professor Fernando Sobrinho, o desafio do futuro prefeito está para além do centro urbano de Palmas, abrangendo a região metropolitana que se configura numa cidade média. “São os chamados consórcios intermunicipais, de forma a pensar formas mais integradas para a região que começa a ter um processo de crescimento muito grande, afetando principalmente a periferia da capital e os municípios de seu entorno”, disse.
“Há ali uma expansão da população migrante mais pobre, que vem à capital do Tocantins em busca de melhores condições de vida, principalmente nas cidades do entorno metropolitano, o que acaba resultando em uma expansão para fora do município de Palmas”, complementou.
Com informações, Pedro Peduzzi, Agência Brasil.
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