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527.182 árvores cortadas

O pau-brasil ainda resiste ao 'Brazil'

Explorado desde que o Brasil foi 'descoberto' pelos portugueses, o pau-brasil chegou a ser declarado extinto, mas a madeira envergou, não quebrou e resistiu ao achaque internacional

25/03/2025 - 11:18 Por Wilson Lopes
O pau-brasil foi a primeira “madeira de lei” do País, pois a extração deveria ser permitida pela Coroa Portuguesa, que exigia o pagamento de impostos pelos exploradores (Jani Pereira/Wikipedia)

Espécie nativa das florestas tropicais da Mata Atlântica, a ibirapitanga fornecia aos indígenas um corante vermelho, utilizado para tingir penas e algodão. Os colonizadores portugueses logo perceberam que, além do pigmento, a madeira era nobre para a fabricação de móveis de luxo, instrumentos musicais de corda e equipamentos navais. Lhe deram o nome de pau-brasil e a transformaram no primeiro produto natural extraído da colônia, despertando um ciclo econômico que atraiu franceses, holandeses, espanhóis e ingleses para a Terra de Santa Cruz.

Desde o século XVI, a história nos conta que extração, comércio e tráfico muitas vezes embarcavam na mesma nau rumo ao continente europeu. Por conta disso, a exploração do recurso, que perdurou até meados do século 19, quase extinguiu a espécie do Brasil.

Com base em referências bibliográficas e documentos pesquisados para a elaboração da tese de doutorado 'Ibirapitanga: história, distribuição geográfica e conservação do pau-brasil - do descobrimento à atualidade', o engenheiro-agrônomo Yuri Tavares Rocha concluiu que foram extraídas, por meio do comércio, tráfico ou contrabando, 527.182 árvores de pau-brasil desde que os portugueses atracaram suas caravelas em Porto Seguro.

"Assim, de acordo com os dados compilados, pesquisados e encontrados até o momento, pode-se resumir a exploração do pau-brasil desde o século XVI: 527.182 árvores de 15m de altura e cortadas em 6.082.867 toras de 1,3m de comprimento, totalizando 91.243 toneladas de madeira."
Yuri Tavares Rocha

Extinção no Espírito Santo e Sergipe

No artigo 'Distribuição geográfica e época de florescimento do pau-brasil', publicado na Revista do Departamento de Geografia, 20 (2010/23-36), da Universidade de São Paulo (USP), Yuri Rocha relata "registros de ocorrência de populações nativas de pau-brasil nos estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte desde o século XVI".

Contudo, após consultas das amostras nos herbários, o pesquisador constatou que não há evidência de pau-brasil nativo nos estados de Espírito Santo e Sergipe, podendo indicar a supressão total da espécie para esses estados. "A distribuição geográfica original do pau-brasil e o tamanho de suas populações nativas sofreram redução pelo corte de árvores, causado pela exploração de sua madeira, pela abertura de áreas para atividades agropecuárias e florestais e pela expansão dos centros urbanos", conclui.

Ação da Prefeitura de plantio nas praças da cidade de Nova Trento, em Santa Catarina; Estado não faz parte do bioma nativo da espécie, mas esforço é para a população conhecer a árvore-símbolo do país  

Árvore nacional

Ainda no regime militar do general Ernesto Geisel surgiu o primeiro esforço governamental para evitar a extinção da madeira, com a promulgação da Lei nº 6.607 (7/12/1978), declarando o pau-brasil árvore nacional. A lei também institui o 'Dia do Pau-Brasil' (03/05) e determinava ao Ministério da Agricultura a implantação, em todo o território nacional, de viveiros de mudas visando à sua conservação e distribuição para finalidades cívicas.

A 'ibirapitanga' fornecia aos indígenas um corante vermelho, utilizado para tingir penas e algodão

Banco genético

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) está desenvolvendo um projeto que busca recuperar parte da riqueza genética perdida pelo pau-brasil. Pesquisadores estão estudando uma das últimas populações de pau-brasil existentes no sul da Bahia a fim de poder utilizá-la no repovoamento de áreas de ocorrência da Mata Atlântica onde a espécie não existe mais.

O projeto está sendo desenvolvido pela Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia na Estação Ecológica do Pau-Brasil. Nessa área, de 7.214 hectares, o pesquisador Sérgio da Cruz Coutinho mantém o Banco Genético do Pau-Brasil, onde reúne material genético das árvores remanescentes - algumas tão antigas que podem datar ainda da época do descobrimento e com até 50 metros de altura - a fim de poder disponibilizá-las para o repovoamento nas regiões onde a espécie não floresce mais.

Para isso, o pesquisador localiza e mapeia as árvores, das quais retira algumas folhas, que são refrigeradas e enviadas por via aérea para Brasília, onde são guardadas à temperatura de 60 graus negativos. Posteriormente é extraído o DNA das folhas, para estudo da variabilidade genética dos indivíduos, feita no Laboratório de Genética de Plantas, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, sob a coordenação do pesquisador Dário Grattapaglia.

O pesquisador Coutinho acredita que naquela região possa existir uma população de pau-brasil, hipótese que só poderá ser confirmada com a análise de DNA. A existência de uma população de pau-brasil é de grande importância, pois, a partir dela, a pesquisa pode selecionar os indivíduos que representem melhor a espécie, e que não tenham parentesco próximo entre si, a fim de que possa expandir o número de árvores existentes e disponibilizá-las para as instituições públicas ou privadas que queiram plantar comercialmente ou mesmo para o reflorestamento em áreas devastadas da Mata Atlântica. Estes plantios podem ser feitos por sementes ou pela clonagem de árvores selecionadas.

E o trabalho já deu alguns resultados. Nas duas estações, foram mapeadas 277 árvores de pau-brasil, além de outras 214 espécies florestais, distribuídas nas 4.588 árvores marcadas. Entre essas espécies estão, o jacarandá da Bahia (Dalbergia sp.), com 66 árvores mapeadas e a palmeira Attalea funifera, conhecida como piaçava, cujas fibras são muito procuradas para a fabricação de vassouras.

Parna do Pau Brasil

Para estimular a preservação da árvore-símbolo do país, o governo federal criou o 'Parque Nacional do Pau Brasil' em comemoração aos 500 anos do Brasil, em 20 de abril de 1999.

O parque, que possui titulação de reconhecimento mundial, conta com 19 mil hectares, localizando-se integralmente no município de Porto Seguro, uma das mais importantes áreas protegidas da Mata Atlântica no sul da Bahia.

A região onde está inserido, denominada Costa do Descobrimento, foi declarada Sítio do Patrimônio Mundial da Humanidade pela UNESCO devido ao seu excepcional valor do ponto de vista da ciência e da preservação de ecossistema de interesse universal.

A Costa do Descobrimento se refere ao fato que foi neste local que, em 22 de abril de 1500, os portugueses desembarcaram pela primeira vez na costa brasileira. Assim, nessa região, podem ser encontrados diversos testemunhos do início da ocupação do Brasil, seja pelos sítios arqueológicos pré-históricos e históricos, seja pelos remanescentes das aldeias jesuíticas (Vale Verde, antiga redução jesuítica de Patatiba dos Anjos e Trancoso) ou pelos núcleos urbanos com muitos exemplos de arquitetura coloniais e prédios históricos.

Com informações, Tese de Doutorado e Artigo do engenheiro-agrônomo Yuri Tavares Rocha; Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia na Estação Ecológica do Pau-Brasil; Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.

Acesse a Tese de Doutorado 'Ibirapitanga: história, distribuição geográfica e conservação do pau-brasil (caesalpinia echinata LAM., leguminosae) do descobrimento à atualidade>>

Acesse o Artigo 'Distribuição geográfica e época de florescimento do pau-brasil (Caesalpinia echinata LAM. Leguminosae)>>

Acesse a LEI Nº 6.607, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1978>>

Acesse a Parna do Pau Brasil>>

Acesse o Bosque dos Constituintes>>

Acesse a reportagem do Banco Genético da Embrapa>>

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