Um dos grandes entraves para a eliminação da malária é a falta de diagnóstico adequado, alerta o chefe do Laboratório de Pesquisa em Malária da Fundação Oswaldo Cruz, Claudio Tadeu Daniel-Ribeiro. Por ocasião do Dia Mundial da Malária (25/06), o Ministério da Saúde divulgou que os casos comprovados da doença caíram 26,8% entre janeiro e março deste ano na comparação com o mesmo período do ano passado. Ainda assim, foram 25.473 registros em apenas três meses.
Daniel-Ribeiro compõe o comitê de especialistas que assessora o governo federal nas ações de controle da doença e considera que as metas de reduzir em 90% os novos casos até 2030 e eliminar a transmissão no país até 2035 são factíveis, desde que a vigilância seja fortalecida em todo o Brasil.
"Embora 99% dos casos de malária ocorram na Amazônia, o mosquito transmissor da doença vive em 80% do território nacional. Então, a malária é um problema fora da Amazônia também, porque hoje as pessoas têm grande facilidade para se locomover, inclusive da Amazônia para a área extra-amazônica, ou vindo de outras áreas endêmicas, como a África, pro Brasil", reforça o imunologista.
A malária é causada por protozoários do gênero plasmodium, transmitidos a partir da picada do mosquito Anopheles, popularmente chamado de mosquito-prego. Um viajante infectado pode demorar até 30 dias para manifestar sintomas e se tornar uma fonte de novas infecções, ao ser picado por fêmeas do mosquito, que vão sugar o protozoário junto com o sangue, e transmiti-lo para outras pessoas.
Além disso, pessoas infectadas pela primeira vez tendem a desenvolver quadros mais graves, com chance maior de morte, por não terem nenhuma imunidade contra a doença.
Por isso, Daniel-Ribeiro reforça a importância do diagnóstico adequado: "É preciso que os médicos fora da Amazônia tenham consciência de que um sujeito com febre, dor de cabeça, sudorese e calafrios, pode ter malária".
Quase todos os casos registrados no Brasil são causados por duas espécies de Plasmodium, a ‘vivax’ e a ‘falciparum’. A primeira tem maior potencial de infecção, e responde por 80% dos casos, mas a segunda representa maior risco de morte. Antes de eliminar totalmente a transmissão, o Brasil também espera acabar com as infecções pelo Plasmodium falciparum até 2030.
Mudanças climáticas
O especialista da Fiocruz explica que a pessoa infectada pelo plasmodium ‘vivax’ já pode transmitir a doença a partir do primeiro dia, enquanto aquela infectada por falciparum só desenvolverá a forma infecciosa do protozoário após sete dias de contaminação.
"Então, se você tratar rapidamente a malária, você não deixa aquele indivíduo infectar novos mosquitos. Mas se não fizer o diagnóstico rápido e não correr para a região onde ele foi infectado para fazer ações de bloqueio de transmissão, você pode ter um novo surto ou até a reimplantação da malária em um lugar onde ela já foi eliminada", ele complementa.
Hoje em dia, os serviços de saúde contam com remédios bastante eficazes para tratar a malária e interromper a cadeia de transmissão, além de testes de diagnóstico rápido, que podem ser realizados com apenas uma gota de sangue. Mas, há um grande desafio no horizonte: as mudanças climáticas.
"A gente eliminou muito mais rapidamente a malária na Europa e na América do Norte, também porque o mosquito e o próprio plasmodium tem uma sensibilidade maior ao clima temperado. Então, se você aquecer demais a temperatura, a gente pode ter a reimplatação da malária em áreas onde ela já foi eliminada. E não há dúvida nenhuma que as alterações climáticas podem facilitar o desenvolvimento e o aumento da transmissão em áreas onde a doença ainda existe, porque as condições ambientais vão dificultar o controle do mosquito"

Situação Epidemiológica
A malária é considerada um grave problema de saúde pública no mundo, sendo uma das doenças de maior impacto na morbidade e na mortalidade da população dos países situados nas regiões tropicais e subtropicais do planeta. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 263 milhões de casos de malária foram registrados em 2023 em 83 países endêmicos. Em 2022 foram 252 milhões de casos. Os óbitos por malária reduziram de 600.000 em 2022 para 597.000 em 2023.
No Brasil, a região amazônica é considerada área endêmica para malária no país, registrando mais de 99% dos casos autóctones. A região compreende os estados do Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins, Mato Grosso e Maranhão. Nas áreas fora da região amazônica mais de 90% dos casos registrados são importados dos estados pertencentes à área endêmica e outros países amazônicos ou do continente africano. Apesar disso, existe transmissão residual de malária em estados da região extra-amazônica, principalmente em áreas de Mata Atlântica.
Dados do Ministério da Saúde apontam uma queda na frequência de casos de malária a partir de 2010 até 2016. Porém, em 2017, foi registrado um aumento de 52,7% nos casos autóctones em relação ao ano de 2016, com 189.515 casos. Em 2018, houve redução de quase 1%. A partir de 2019 são observadas reduções subsequentes até 2022, com a mais expressiva sendo de 18,4% em 2019, quando foram notificados 153.268 casos autóctones. Em 2023, foram registrados 140.265 casos autóctones de malária no país, um aumento de 8,8% em comparação ao ano anterior. Do total de casos autóctones registrados no país em 2023, 17,3% foram de malária por P. falciparum e malária mista, sendo os outros 82,7% de malária por P. vivax e outras espécies.

Mortes por malária
Em relação às mortes por malária, no ano de 2018, após o aumento do número de casos em 2017, o número de óbitos aumentou 64,7%, indo de 34 em 2017 para 56 em 2018. No ano seguinte, 2019, houve redução de 33,9%, tendo o Brasil registrado 37 óbitos. Em 2020 ocorreu novo aumento, neste ano foram registrados 51 óbitos, 37,8% de aumento em comparação ao ano anterior. Após sucessivos aumentos, em 2023, foram registrados 63 óbitos por malária, 10% a menos que no ano anterior.
A letalidade por malária na região amazônica é baixa, chegando a 0,04% no ano de 2023. Já na região extra-amazônica, a letalidade chega a ser 51,1 vezes maior que na região amazônica, chegando a 1,87% (dados preliminares).
O óbito nessa região ocorre, na maior parte, em pessoas que vêm infectadas de outros países ou de estados da região amazônica e não recebem o diagnóstico e tratamento oportunos e adequado, devido à dificuldade na suspeição de uma doença que não é frequente nesta área do país e pela desinformação dos viajantes a respeito dos seus riscos. Acesse para mais informações sobre a malária na região extra-amazônica.
Picada de fêmeas
A malária é uma doença febril. A transmissão ocorre através da picada de fêmeas do gênero Anopheles infectadas, que, ao se alimentarem do sangue humano, acabam inoculando o parasito na corrente sanguínea humana. O principal vetor de malária no Brasil é o Anopheles darlingi, uma espécie amplamente distribuída no território sul-americano que tem comportamentos favoráveis para a transmissão da malária, sendo altamente antropofílico e endofílico.
A transmissão da malária é influenciada por diversos fatores, que incluem fatores climáticos (temperatura, umidade, altitude etc.), antrópicos (desmatamento, alta mobilidade, garimpagem etc.) e de estruturação dos serviços de saúde. Essas características fazem da região amazônica brasileira endêmica para a doença, concentrando cerca de 99,98% dos casos de malária no Brasil. Ainda que concentre grande parte dos casos de malária, sua distribuição na própria região amazônica não é homogênea, com áreas apresentando uma alta transmissão e outras completamente livres da doença.
Com informações, Tâmara Freire, Agência Brasil; Boletim Epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente; Ministério da Saúde.
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